Hidrazina, o combustível banido das competições


Em competições de automóveis o uso de combustíveis exóticos e misturas "dementes" acontece com certa frequência há muito tempo.

Há relatos que o uso da Hidrazina como combustível vem um pouco antes de 1944 durante a segunda guerra mundial, no “avião-foguete” Messerschmitt Me 163 Komet, fabricado pela Walter na Alemanha. O M-163 foi concebido para ser um interceptador de bombardeiros a curta distância.

Talvez tenha sido o projeto mais “tenso” da história aeronáutica alemã, devido à volatilidade dos combustíveis testados na aeronave. Reza a lenda que 50% dos testes realizados pela Walter para a Luftwaffe resultaram na morte dos pilotos, muitos deles devido a explosão da aeronave em pleno voo durante turbulências. Além disso, o Me 163 utilizava rodas descartáveis para a decolagem. Ao pousar, utilizava-se do próprio fundo do avião, deixando assim, muitos pilotos paraplégicos pelo do choque do avião com o solo. Pois é meu amigo leitor, 50% explodiam no ar, e quando isso não ocorria o piloto era obrigado a pousar “de barriga”, e de preferência com o tanque vazio. E eu me achando um cara corajoso... 

Se você já esta assustado até aqui, saiba que as coisas ficaram ainda piores quando “inventaram” de misturar a Hidrazina com o já perigoso nitrometano na década de 50, para potencializar os motores de corrida nos lagos salgados e de Arrancada nos Estados Unidos da América.
Para entendermos o funcionamento da Hidrazina misturada ao Nitromentano, é preciso conhecer de forma básica um pouco sobre o funcionamento do Nitromentano no motor a combustão. Para que um motor obtenha maior potência é necessário que ele consiga absorver maior quantidade de oxigênio. Lembrando um pouco das aulas de biologia, nossa atmosfera possui 78% de nitrogênio, 21% de oxigênio, cerca de 0,9% de dióxido de carbono, água e 0,1% de outros gases. 

Se o motor funciona com a proporção entre oxigênio e combustível, conseguimos visualizar melhor a dificuldade natural devido a proporção atmosférica de apenas 21%, bem como a importância que o oxigênio tem para produzir potência no motor à combustão. Na eficiência termodinâmica a proporção entre o oxigênio e o combustível é chamada de estequiometria. Na estequiometria a gasolina sem adição de álcool precisa de 14,7 partes de oxigênio para 1 de combustível (14,7:1) para a queima eficiente. Já o Etanol de 9,0:1 , o Metanol de 6,4:1. O Nitrometano necessita da proporção de 1,7:1 para que obtenha a queima perfeita quando a aplicação é pura, isto é, 100% Nitrometano sem a diluição com qualquer outro combustível. 

Como o Nitrometano é um mono-propelente que carrega em sua composição química dois átomos de oxigênio, o nível de oxidação o transforma em um combustível poderoso, e a combustão resulta em média, 2,2 vezes maior potência no motor quando comparado à gasolina, ambos quando em pureza de 100%. A maioria dos competidores prefere utilizar o Nitrometano diluído ao Metanol nas mais variadas proporções, chegando até mais de 90% de Nitromentano em alguns casos, sendo assim, o resultado do ganho depende diretamente da proporção, bem como o acerto do motor . 

Agora que já sabemos de forma básica como o Nitrometano funciona, podemos partir para o extremo da linha, a Hidrazina combinada ao Nitrometano. A Hidrazina é primariamente um produto químico intermediário na produção de outros produtos químicos destinados a diversas áreas, da agricultura a aeroespacial. Serve para removedor de oxigênio e outros gases em caldeiras, como composição química em sistemas de calafetação e polimerização de catalizadores, entre outros. 
 
A hidrazina anidra (N2H4) tem como função principal a indústria aeroespacial como combustível mono-propelente, utilizado no controle orbital dos 56 satélites da linha HS376 - aquele “jatinho” executado para movimentação em órbita controlando a direção e altitude dos satélites. Um de seus derivados, o Dimetil-hidrazina é um combustível bi propelente utilizado em foguetes, capaz de entrar em combustão apenas por contato (Hypergolic). 

Hidrazina nos motores de competição:
A captura de oxigênio da hidrazina é tão forte, que os competidores utilizavam em média 10 ml em 3,7 litros de Nitrometano, rendendo nada mais nada menos do que 3,4 vezes a potência do motor. Por exemplo; um motor de 10 cavalos, sem fazer qualquer tipo de alteração para ganho de potência, com o nitrometano e hidrazina devidamente acertados, a potência do motor saltaria para algo acima de 34 cavalos. Da mesma maneira que os olhos expressam o espanto, triplique a emoção para o perigo do uso.
Enquanto o nitromentano é um combustível que já devemos tomar uma série de cuidados, o erro da mistura de hidrazina ao nitrometano é suficiente para transformar o reservatório de combustível em uma bomba de grandes proporções.
A Hidrazina tem aroma de amoníaco e é incolor. É um produto extremamente tóxico e corrosivo, capaz de fazer estragos enormes ao tocar na pele e te matar das mais diversas maneiras. 
 
É tão perigoso que durantes as competições realizadas na década de 60 nos EUA, enquanto o combustível ainda era permitido, os pilotos tinham que retornar aos boxes o mais rápido possível para que o tanque e toda a linha de alimentação fossem drenados imediatamente, pois em apenas 20 minutos (com a proporção de 10 ml) a reação química faz com que criem carboidratos, formando pequenas borras espessas como sabão chamadas de sal do ácido hidrazinico, este "sal" é explosivo e extremamente sensível ao choque. 
 
Existem ainda relatos de que os gases restantes da mistura explodiam carburadores ao simples toque da chave de fenda. Para saber se um competidor estaria usando a Hidrazina, era só observar a cor verde da chama nos escapamentos e o desespero da equipe para esgotar o combustível logo após chegar ao box. 

Segundo relatos de pilotos e preparadores da época, em uma matéria da revista Hot Rod de 1970, os motores explodiam “parados”, quando muito duravam algumas puxadas. Virabrequins eram jogados ao solo sem cerimonia, cabeçotes decolavam... Alguns preparadores chegaram ao ponto de limitar de forma consciente o uso do motor para apenas um dia de corrida, depois o destino era o lixo. 
 
O combustível já misturado é tão perigoso que se derramado sobre qualquer metal enferrujado (dióxido de ferro) é capaz de explodir. E para complicar ainda mais as coisas, os motores alimentados com a mistura de hidrazina com o nitrometano tinham vida própria, costumavam não desligar cortando a ignição, ou mesmo fechando a borboleta, era necessário cortar toda a alimentação do motor... Isso ocorria acelerando nos boxes, na linha de largada e no final da puxada nos 402 metros. 
 
No ápice da Hidrazina em competições de Arrancada ocorreu na década de 60, onde as proporções eram de 90% de nitrometano, 2% de hidrazina e 8% de metanol. Segundo alguns preparadores da época, não havia como determinar com precisão a estequiometria ideal, pois tudo era imprevisível. O que era feito era iniciar o acerto com a proporção mais rica do que a do nitrometano, cerca de, 1.5:1 a 1.2:1 e a ignição acima dos 35 graus. 

A hidrazina foi banida da NHRA e de todas as competições automobilísticas nos EUA. A busca por potência nos motores a explosão não tem fim e por muitas vezes nem meios. Isso já custou algumas vidas e a hidrazina é um dos grandes responsáveis por mortes, acidentes graves, queimaduras e doenças como o câncer. 

A matéria tem cunho apenas informativo e histórico. Jamais utilize a Hidrazina como combustível ou faça experiências. Não há estudos suficientes para garantir a utilização.

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